ER – Review: Kisangani (22/22)

 

Episódio: Kisangani
Temporada: 9.ª temporada
Canal: RTP 2
Primeira transmissão Portugal: 19 de Julho de 2007
Primeira transmissão EUA: 15 Maio de 2003

“We vacined 200 hundred children today. When was the last time you saved 200 hundred lives in one afternoon?”

O último episódio da 9.ª temporada de ER chegou finalmente aos ecrãs portugueses e exibiu uma abordagem completamente diferente da usual, uma vez que a acção decorreu integralmente fora do County General, mais propriamente em terras de África.
O título do episódio – “Kisangani” – é elucidativo quanto ao assunto principal, pois trata-se na realidade do nome de uma cidade africana, indo ao encontro das alusões feitas nos últimos episódios, assim que se teve conhecimento da ida de Kovac (Goran Visnjic) para o Congo, numa acção humanitária, à qual Carter (Noah Wyle) se juntaria mais tarde.

Kisangani foi palco de um real e pesado conflito armado, de uma guerra civil sem precedentes, facto bem retratado pelos argumentistas deste episódio, já que se pôde observar manifestamente as suas sequelas, sobretudo na escassez de bens de primeira necessidade, vitais à subsistência e sobrevivência de qualquer ser humano. A doença e o sofrimento galopavam entre a população, sem dó nem piedade, numa calma e silêncio doentios, naturais em quem já se conformou com a amarga realidade.

Na verdade, este local hostil e estéril, ao qual Carter estava até ao momento alheio, por se distanciar do que conhecia, acabou por confinar os medos e angústias dos dois médicos. Diante deste panorama telúrico, as mágoas pessoais destes reduziram-se a uma insignificância assustadora. É certo que ainda não se concluiu, quais os motivos da raiva e desespero de Kovac, apesar de continuar a achar que estes estão profundamente relacionados com a perda da sua família na Croácia. Este episódio veio confirmar esta certeza, pois a postura do médico croata em Kisangani funciona quase como a voz anti guerra desta contenda. Isso fica bem patente na conversa que manteve com Carter, ao dar a sua opinão sobre a tragédia humana que assola, de um modo corrosivo, países que não vivem um regime democrático, onde invariavelmente toda a população sofre, ao contrário do que acontece nos EUA.
“In the beginning there’s always a lot of talk of national pride and patriotic speeches. But after a few weeks it becomes this: Nothing but death and sadness. These people just want what everyone else wants. They’re kids to have something to eat, to see them grow up, laughing, happy. They don’t care where
the boarder is or who get’s to call themselves president. They just want this to stop
.”

                                                                    (Kovac em Kisangani)

     

A correlação com o que aconteceu com os seus filhos e esposa torna-se premente, sobretudo para se entender onde residem as forças para continuar a lutar por um ideal, ou, pelo contrário, para “baixar as armas”: “And then my family was gone. I could’nt remember why it was all so important. What difference did it all make? My children were dead.” Por tudo isto, Kovac adopta uma atitude mais aguerrida perante a adversidade deste ambiente bélico, não descurando, mesmo assim, um novo caso amoroso, que conquistou junto da equipa médica, ou seja, com a enfermeira Gillian (participação de Simone-Elise Girard), algo que vem evidenciar a sua persistente instabilidade emocional.

                                                                    (Carter em Kisangani)

      

Em contrapartida, Carter mostra-se chocado com o caos que encontra, quando chega a Kisangani, apreendendo de um modo inquieto a dramática situação em que se vê envolvido, perceptível nos seus olhares de espanto, incredulidade e perplexidade… a imagem de desordem e descalabro “ostenta” novos contornos, principalmente nos semblantes amargurados de pais e filhos, que buscavam apenas alguma paz para os seus familiares. Carter constata a mais dura das realidades naquele serviço de urgências improvisado: a maioria das mortes deve-se a doenças curáveis e fáceis de prevenir. A impotência é notória…

Noah Wyle e Goran Visnjic demonstraram neste episódio de ER a versatilidade artística que possuem, que se expande para além das paredes do County General, podendo passar por diferentes registos. Devo confessar que gostei especialmente da prestação de Carter neste que considero o seu melhor episódio da temporada. Conseguiu abandonar finalmente a inércia que o seu personagem vinha a manifestar nos últimos tempos, atestando que o seu personagem precisava de facto de uma viragem. Eu sempre acreditei neste actor e na sua personagem, que desde o primeiro episódio me conquistaram.

Sublinho a magnífica forma como Carter e Kovac “transportaram os espectadores” para um duro cenário de guerra, ao qual somos quase sempre indiferentes, por inúmeras razões. Todavia, eles tiveram a oportunidade de marcar a diferença, ao procurarem diferentes meios de combater a raiva pessoal que sentiam do outro lado do mundo e que julgavam legítima. Ajudar os outros terá sido, sem dúvida, a melhor alternativa. 

Entre os dois médicos acabou por acontecer o impensável: tornaram-se cúmplices, algo que nunca acontecera durante todo o tempo em que trabalharam juntos em Chicago. Contudo, em Kisangani trabalharam, sentiram, partilharam, conheceram-se melhor… sem interferências. Nunca irei esquecer a troca de olhares dos dois, num claro gesto de mútua preocupação, após o ataque das milícias Mai-Mai a que foram sujeitos e de onde escaparam, graças ao facto dos soldados se recordarem que Carter tinha tantado salvar um deles dias antes. Foi, sem dúvida, uma cena brutal, de arrepiar, difícil de esquecer, mas que elucida a árdua tarefa de todos os que optam por ajudar em cenários de guerra. Eu fiquei de olhos pregados no televisor…

Tudo isso no vídeo a seguir:

Após uma série de acontecimentos perturbadores e ainda inconformado com o que viu, Carter acaba por regressar ao EUA e a casa de Abby (Maura Tierney), deixando Kovac em Matenda a cuidar de alguns doentes, que não se podiam deslocar para Kisangani e que o médico croata não conseguiu abandonar.

A última cena deste episódio transpirou bom gosto e emoção, com especial enfoque no silêncio do quarto de Abby. Enquanto esta dormia, Carter observava-a atentamente na penumbra, acabado de regressar provavelmente da experiência mais enriquecedora e marcante da sua vida. A pergunta impõem-se: terá valido a pena esta ausência e  será Carter bem recebido por Abby?

Trata-se efectivamente de um episódio bem realizado, produzido e editado, com uma estrutura que não pecou por ser diferente. Destaque para a banda sonora, que se fez valer de músicas originárias do Congo, algo que conferiu a cada momento a densidade desejada. Destaco ainda o trabalho dos argumentistas, que conseguiram, na minha opinião, fomentar um arco plausível com o argumento da 10.ª temporada.

As filmagens deste episódio decorreram no Hawai (EUA), não desviando, no entanto, a importância de um tema, que infelizmente continua na ordem do dia – falo na violação dos direitos humanos e nos regimes ditatoriais que se conhecem um pouco por todo o mundo.

Este episódio terá consequências em episódios da nova temporada, que já principiou no AXN.
Contem com a review do primeiro episódio muito em breve. Até lá!

5 Responses to ER – Review: Kisangani (22/22)

  1. Jubylee diz:

    Olá! Só agora tomei conhecimento deste blog e gostei bastante do que vi! Têm aqui mais uma leitora fiel.

  2. Excelente review. 😉

    Foi um episódio maravilhoso, um dos melhores da temporada, fazendo bem a passagem de uma série para a outra. Cenas de cortar a respiração, que não deixam ninguém indiferente. Grande trabalho!

  3. Zina diz:

    Foi um episódio Brutal!
    Adorei cada minuto, marcou-me de uma forma que não sei explicar.
    Para não falar que os meus personagens preferidos tiveram lugar de destaque e exclusivo e superaram todas as expectativas.

    A tua review maravilhosa como sempre 🙂

  4. diana diz:

    Foi de facto um episódio inesquecivel! Pesado, mas era o que a situação exigia. Cenas maravilhosas que retratam o trabalho magnifico e os actos heróicos de todos os médicos e enfermeiras voluntários, retratam a miséria, a necessidade a escassez de tudo em terras de África. Um daqueles episódios que não se esquece e que nos deixa a pensar.
    Grandes interpretações pelos principais actores, Noah Wyle e Goran Visnjic.

    A review fantastica também. Continua!

  5. nuno moreira diz:

    foi de facto, e sem duvida o melhor episodio de e.r. q ja vi!!! mas gostaria d pedir se me poderiam dizer qual o nome da banda sonora com q termina o episodio…é q é fantastica

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